Comparação entre anticoagulantes orais para trombo de ventrículo esquerdo (No-LVT Trial)

06/04/2021, 00:00 • Atualizado em 21/12/2023, 17:30

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  • André Zimerman - Médico Internista e Residente de Cardiologia no Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA)

Fundamentação: Pacientes com trombo em ventrículo esquerdo apresentam risco constante de embolia, que pode ser mitigado pelo tratamento anticoagulante. Por segurança e praticidade, os antagonistas da vitamina K (como a varfarina) têm perdido espaço para os anticoagulantes diretos (DOACs) em vários cenários, mas os DOACs ainda não haviam sido adequadamente testados na trombose ventricular. Estudos observacionais com resultados equívocos geraram mais incertezas sobre sua segurança. E até agora não existia estudo randomizado que comparasse DOACs vs. varfarina em pacientes com trombo de ventrículo esquerdo.

Metodologia: Este ensaio clínico incluiu pacientes com trombo ventricular esquerdo visualizado na ecografia transtorácica. Foram excluídos aqueles com doença renal crônica (CrCl <50 ml/min), fibrilação atrial, história de trombose venosa profunda ou de embolia pulmonar, e aqueles já em uso de anticoagulantes. Os participantes foram randomizados 1:1 para receber rivaroxabana 20 mg 1x/dia ou varfarina 1x/dia (dose ajustada para INR alvo 2-3). O desfecho primário foi resolução do trombo à ecografia em 1, 3, e 6 meses. Importante destacar que o ensaio clínico foi totalmente aberto: os médicos assistentes, os participantes, e os avaliadores estavam cientes da medicação em uso. A amostra foi calculada para detectar não-inferioridade do grupo rivaroxabana em relação ao de varfarina, considerando margem absoluta de não-inferioridade de 10% (ou seja, uma amostra suficiente para descartar que a rivaroxabana fosse 10% pior do que a varfarina).

Principais Resultados: O estudo incluiu 79 participantes. A idade média foi de 50 anos, 43% eram mulheres, 78,5% apresentavam miocardiopatia isquêmica, a fração de ejeção média foi de 37%, e o tamanho médio do trombo foi de 16,1x11,5 mm. 53% dos participantes estavam em uso de dupla terapia antitrombótica. No grupo varfarina, o INR permaneceu no alvo em 82% do tempo.

O desfecho primário – resolução completa do trombo – tornou-se mais frequente com o decorrer do tempo: em 1 mês, 72% (rivaroxabana) vs. 47,5% (varfarina); em 3 meses, 77% vs. 67,5%; e em 6 meses, 87% vs. 80%. Embora sempre numericamente favorável à rivaroxabana, essa diferença foi significativa somente no primeiro mês (odds ratio 2,8; p=0,03). Em relação a eventos adversos, nenhum acidente vascular encefálico ou embolia sistêmica ocorreu no grupo rivaroxabana vs. 6 casos (15%) no grupo varfarina. Sangramento maior ocorreu em 2 pacientes (5%) com rivaroxabana vs. 6 (15%) com varfarina.

Conclusões: Para casos de trombose ventricular esquerda, a rivaroxabana foi não-inferior e gerou resposta mais precoce que o tratamento padrão com varfarina.

Impacto Clínico: As críticas ao artigo são óbvias: estudo aberto, de poder limitado, desfecho intermediário e com variabilidade de medida. Mas é um estudo que responde uma pergunta relevante. E que por isso é útil.

"Mas e o N pequeno?"

Sim, o estudo incluiu poucos participantes, e baseou-se numa extensa margem de não-inferioridade (pensemos: se a rivaroxabana fosse 9% pior, nós poderíamos mesmo dizer que seria não-inferior?). Mas foi o suficiente para demonstrar segurança, e sugerir eficácia no mínimo tão boa quanto.

"Mas por que não tentar superioridade?"

Porque basta que os DOACs sejam não-inferiores para que se tornem a escolha natural, pela facilidade e conveniência de uso.

"Mas e o desfecho, resolução do trombo, que não é clinicamente relevante?"

De fato. Mas nesse caso o desfecho relevante – AVE, embolia – decorre diretamente do trombo ventricular. Para um estudo inicial, é bastante razoável inferir que dissolver o trombo reduz o risco de eventos embólicos.

"Mas e o fato de ser open-label (aberto)?"

Essa é a maior limitação. Os aferidores sabiam em que grupo o paciente estava, e o exame realizado (ecografia) é muito dependente do examinador/aferidor. Provavelmente houve viés na medida. Creio que não o suficiente para invalidar o resultado do estudo porque a ecografia normalmente não apresenta tamanha variabilidade, mas essa é uma opinião controversa.

O próximo passo é um estudo com mais participantes e desfecho clinicamente relevante (acidente vascular encefálico, embolia sistêmica, infarto agudo do miocárdio, óbito, sangramento maior). Vai demorar. Até lá, sinto-me seguro para usar qualquer dos DOACs em pacientes com trombose ventricular esquerda.

Referência:

  1. Abdelnabi Mahmoud, Saleh Yehia, Fareed Ahmed, Nossikof Alexander, Wang Ling, Morsi Mahmoud, et al. Comparative Study of Oral Anticoagulation in Left Ventricular Thrombi (No-LVT Trial). Journal of the American College of Cardiology. 2021 Mar 30;77(12):1590–2.
  2. #TERAPIA_ANTITROMBOTICAS

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